quarta-feira, fevereiro 24, 2010

Renovar a esperança

Sou sportinguista sofredor. Sofri, durante dezoito anos, com a ausência de títulos da minha equipa e, durante todos esses anos, fui recordando várias vezes, como em sonho, o Sporting mágico de Manuel Fernandes e Jordão, que contribuiu para que tivesse uma infância ainda mais feliz. Foram dezoito anos de esperança, renovada a cada nova época. Acreditei sempre. Até que voltámos aos títulos. Primeiro, pela mão de Inácio, depois pela de Boloni. E voltei a rugir a minha alegria de ser leão.
Hoje, o jejum é, de novo, longo. Mas o pior é que, nos últimos anos, essa minha esperança sempre renovada tem sido posta à prova. Primeiro, as discussões financeiras tomaram conta do meu clube. Parecia mais importante um sportinguista saber qual o valor do passivo ou o que era “projecto financeiro” do que falar, sentir e respirar futebol e a emoção das vitórias.
Ainda assim, e por muito que hoje se insista em criticar, a verdade é que, já nesse período, Peseiro fez todos os sportinguistas sonharem de novo. Sonhámos, em conjunto, com o título de campeão e com a conquista da Taça UEFA. É verdade que tudo se esfumou, menos o facto de que essa equipa, a de Peseiro, jogava com alegria e dava espectáculo.
Depois, veio Paulo Bento. E, em termos futebolísticos, parece que a tristeza tomou conta dos jogadores do meu clube e, através deles, contagiou-se a toda a família sportinguista. Admito que, com Paulo Bento, havia Esforço, Dedicação e Devoção…
E sim, ganhámos umas taças, sim, ficámos quatro vezes em segundo, sim, fomos à Champions, mas… do Sporting esperamos sempre mais do que “meias-glórias”. Queremos a Glória inteira, aquela que completa o nosso lema.
No futebol jogado, passámos a uma coisa cinzenta, triste, apagada, a antítese do espectáculo com que todos vibramos. A verdade é esta: desde que Paulo Bento tomou conta do Sporting, e salvo uma ou outra excepção, tornou-se aborrecido ver o Sporting jogar. Paulo Bento concentrou-se nos resultados e esqueceu-se da alegria e do espectáculo que o futebol também deve ser.
Hoje, já sem Paulo Bento, estamos ainda mais tristes e todos ralham. Na realidade, está instalada no clube uma conversa de surdos. Os mais acalorados clamam por revoluções, manifestações, limpezas e vassouradas. Atacam tudo e todos, dos dirigentes aos jogadores, passando pela equipa técnica. Os dirigentes atacam os adeptos. Os jogadores, esses, são talvez os únicos que atacam pouco (sim, há alguma ironia nisto) …
No Sporting, parece que chegámos ao ponto em que cada um é dono da verdade única e dela não abdica. Está instalada a emotividade, que nunca foi boa conselheira. Para que o Sporting consiga ultrapassar a crise, é bom que aprendamos de novo a falar entre nós, o que também implica saber ouvir. Não há nenhum dono da verdade. Ela não está na posse exclusiva dos dirigentes, dos técnicos, dos jogadores, das claques ou dos sócios e adeptos, mais ou menos anónimos.


Vamos a factos:
Não há Sporting sem dirigentes. Não há Sporting sem atletas e técnicos. Sobretudo, não há Sporting sem sportinguistas. E não há futebol português sem Sporting. Estas são, para mim, as únicas verdades incontestáveis.
Quanto aos dirigentes, admitamos até o pior cenário, pintado por alguns: fazem tudo, mas mesmo tudo mal! (esclareço que, admitindo que têm sido cometidos vários erros, alguns deles graves, não concordo com este ponto de vista).
A questão é: qual a alternativa credível? Quem se propõe fazer uma mudança radical da situação, para engrandecimento exclusivo – é esse o único ponto que me importa – do Sporting Clube de Portugal?
Quais os projectos alternativos, com um mínimo de credibilidade, que se apresentaram nos últimos anos aos sócios? – A resposta, creio que praticamente consensual, é: nenhum, nada, zero!
Quanto aos atletas e técnicos, tem existido um sub-investimento naquilo que é a base competitiva de um clube que se quer grande, o seu plantel. Hoje, o Sporting tem poucos jogadores de qualidade inegável – Liedson à cabeça, Moutinho, Carriço e Izmailov esgotam, na minha opinião, a lista.
Há grandes promessas que têm ainda muitas provas a dar: Rui Patrício, Saleiro, Adrien, João Pereira, Miguel Veloso, Matias Fernandez…
Há jogadores que são esforçados mas que, neste momento, não passam da mediania e aparentam estar na fase descendente da carreira: Caneira, Polga, Tonel, Abel …
Há, também, algumas incógnitas: Pedro Mendes e Pongolle, porque só agora chegaram, têm direito a todo o benefício da dúvida e Vukcevic, que começou por entusiasmar, parece neste momento um corpo estranho à equipa.
E há, sobretudo, uma maioria de jogadores que não têm futebol suficiente para jogar de leão ao peito.
Pois é, o que não há mesmo é milagres.
Enquanto os adeptos continuarem a atacar os dirigentes e a assobiar alguns dos nossos melhores jogadores, enquanto os dirigentes forem incapazes de tirar o Sporting desde marasmo desesperante e insistirem numa postura relativamente autista de “donos da verdade”, enquanto os jogadores se afundarem em crises de confiança para as quais eles próprios contribuem, o Sporting não vai sair da crise.
Os dirigentes são estes, os sportinguistas são estes, é este o nosso Sporting. Só se soubermos falar uns com os outros, em vez de tentar falar mais alto do que os outros, vamos encontrar soluções e renovar a nossa esperança.